É incrível lembrar-se
de certas coisas e pensar que há apenas 10 ou 15 anos o mundo era completamente
diferente do que é hoje. O politicamente correto já existia, mas a compreensão
sobre a dimensão do nosso papel, como publicitários, dentro de tudo isso ainda
era muito precária. Se ainda hoje nos surpreendemos com campanhas pra lá de
duvidosas (pra dizer o mínimo), se ainda vemos tropeços, ou verdadeiros tombos das
agências, imagine o quanto isso era factível de acontecer antes de todos terem
voz e vez nas redes sociais.
Um dia
entro na sala do diretor de criação e ele, todo empolgado, me conta a sua ideia
genial para uma campanha para o público infantil: uma espécie de game em que,
para fazer pontos, as crianças deveriam socar virtualmente um boneco tipo
João-bobo. O bonequinho ia então ficando machucado, com hematomas e afins.
Acredite, faz muito pouco tempo em que isso parecia engraçado, ingênuo e
inofensivo pra muita gente, inclusive para um criativo bem informado e
inteligente, e provavelmente para o cliente. Engoli em seco, meu cérebro deu um
nó, tive vontade de gritar meus argumentos conta aquilo que me parecia absurdo
demais, violento, descabido, mas me contive. Eu perderia a razão se me
colocasse imediatamente contra, principalmente de modo passional ou “panfletário”,
iniciaria ali uma discussão e o foco se perderia. Já tinha vivido o suficiente
para saber que a gente pode até ter razão, mas a maneira como colocamos nossos
argumentos podem nos fazer perder uma discussão. Também sei que há pessoas
muito competitivas, cujo objetivo é ganhar a discussão e não chegar ao melhor
termo. Para que arriscar e deixar uma peça dessas ir ao ar?
Em vez de fechar
questão naquela hora, disse que aquela poderia ser uma possibilidade, mas que
eu gostaria de fazer algumas pesquisas sobre o target para que ele pudesse
desenvolver a ideia com mais embasamento e segurança, e que depois voltaríamos
a falar sobre o assunto. Corri para a minha sala e imediatamente iniciei minha “pesquisa”,
me municiando com artigos, estudos, exemplos de coisas parecidas que tiveram um
péssimo desfecho para a imagem da marca e, claro, para a imagem do cliente e da
agência. Juntei o material e levei ao
criativo, pedi que lesse com atenção. Expliquei rapidamente o conteúdo do material
que recolhi e deixei que ele mesmo tirasse suas conclusões.
Naquele dia
eu matei uma ideia. E me senti muito bem com isso.
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